Produção endógena dos hormônios esteróides
Os corticosteróides são substâncias endógenas que estão quimicamente classificadas como esteróides, e são originalmente identificados no córtex da glândula adrenal.
A glândula adrenal na verdade consiste em duas pequenas glândulas dispostas acima dos rins. A porção externa da glândula adrenal, o córtex adrenal, é essencial para a vida. Sua origem embriológica é completamente diferente daquela da medula adrenal.
O córtex adrenal produz vários hormônios potentes, todos derivados esteroides possuindo o núcleo químico característico. Estes hormônios esteróides são agrupados em 3 classes gerais, cada uma com funções características:
(1) Os glicocorticóides, que atuam primariamente no metabolismo das proteínas, carboidratos e lipídeos.
(2) Os mineralocorticóides, que atuam primariamente no transporte de eletrólitos e na distribuição de água nos tecidos.
(3) Os androgênios ou estrogênios, que atuam primariamente sobre as características sexuais secundárias em seus órgãos alvos específicos.
No ser humano, o principal glicocorticóide é o cortisol (ou hidrocortisona), enquanto o mineralocorticóide mais importante é a aldosterona.
A produção endógena destes hormônios começa pela ativação do hipotálamo e, este ativado secreta o fator liberador de corticotrofina (CRF). Este fator irá ativar a pituitária anterior, a qual liberará o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), o qual ativará o córtex da adrenal e serão liberados 2 classes de hormônios: os glicocorticoides e os mineralocorticoides. (Fig. 1)
Os glicocorticoides, cujo principal é o cortisol ou hidrocortisona, ativando os seus receptores, chamados receptores de glicocorticoides, produzem vários efeitos no organismo, sendo eles: efeito antiinflamatório, efeito imunossupressor e efeitos nos mais variados metabolismos.
Os mineralocorticoides, sendo o principal a aldosterona, ativando os receptores mineralocorticoides, são responsáveis pela manutenção do equilíbrio hidroeletrolítico, onde é responsável pela reabsorção do sódio e agua pelos rins.
Entretanto, a hidrocortisona devido a semelhança de estrutura química com a aldosterona, ativa tanto os receptores glicocorticoides como os receptores mineralocorticoides, produzindo, assim, todos os efeitos citados anteriormente, ou seja, efeito antiinflamatório, efeito imunossupressor, efeitos nos mais variados metabolismos e reabsorção de sódio e agua.
Além disso, como mostra a Fig. 1, os glicocorticoides também tem a função de inibir a atividade do hipotálamo quando estes hormônios estiverem em altas concentrações no organismo, inibindo assim a própria produção e impedindo o excesso destes hormônios no organismo.
Fig. 1: Eixo hipotálamo-pituitária-adrenal. Eixo para a produção dos hormônios esteroides.
Efeitos fisiológicos dos glicocorticoides
1- Efeitos no metabolismo
– cálcio: diminuição da absorção gastrointestinal do cálcio e aumento da sua excreção renal, produzindo um balanço negativo deste íon no organismo.
– proteínas: aumento da sua degradação no musculo esquelético, juntamente com a diminuição da sua produção.
– carboidratos: aumento da produção de glicose através da gliconeogênese.
– lipídios: os glicocorticoides são responsáveis pela distribuição corpórea da gordura, onde a gordura distribuir-se-á em maior quantidade na região abdominal e na região dos ombros.
– estímulo da secreção de noradrenalina pelo simpático: este efeito produzirá um aumento na pressão arterial, devido a ativação dos receptores alfa-1 localizados nos vasos sanguíneos.
2- Efeitos mineralocorticoides
Os glicocorticoides também ativam os receptores de mineralocorticoides, produzindo, assim, reabsorção renal de sódio e água.
3- Efeitos antiinflamatório e imunossupressor
Os glicocorticoides inibem as manifestações tanto iniciais quanto tardias da inflamação, isto é, não inibem apenas o calor, rubor, dor e edema iniciais, mas também inibem os estágios posteriores da cicatrização e reparo das feridas e reações proliferativas observadas na inflamação crônica.
Estes efeitos são devidos a várias ações dos glicocorticoides, os quais são listados a seguir:
– diminuição de neutrófilos,
– diminuição de macrófagos,
– diminuição de fibroblastos, produzindo diminuição da produção do colágeno,
– diminuição de células T,
– diminuição de eicosanoides (protaglandinas, protaciclinas, tromboxanos e leucotrienos),
– diminuição de citocinas,
– diminuição de componentes da cascata de coagulação,
– diminuição de histamina,
– diminuição de anticorpos.
4- Efeito de inibição do hipotálamo
Os glicocorticoides, quando em maiores concentrações no organismo tem a função de inibir o hipotálamo, a fim controlar a própria produção para não permitir a sua quantidade excessiva no organismo.
ANTIINFLAMATÓRIOS ESTERÓIDES (AIEs) ou
ANTIINFLAMATÓRIOS ESTEROIDAIS ou
ANTIINFLAMATÓRIOS HORMONAIS ou
GLICOCORTICÓIDES
Como dito anteriormente, os hormônios glicocorticóides possuem efeitos anti-inflamatório e imunossupressor, os quais podem ser utilizados na clínica em diversas situações em que seja necessário reduzir dramaticamente a resposta inflamatória e suprimir a imunidade, tais como inflamação, asma, doenças autoimunes, em transplantes a fim de evitar rejeição do órgão, dentre outras.
Sendo assim, foi sintetizado o fármaco hidrocortisona em laboratório, a fim de administra-la em doses maiores quando comparada a quantidade produzida fisiologicamente, a fim de produzir estes efeitos em maior intensidade no organismo.
Entretanto, a estrutura química hidrocortisona além de ativar os receptores glicocorticoides e produzir os efeitos desejados, também ativa os receptores mineralocorticoides, os quais retém sódio e água, produzindo inchaço no indivíduo.
A fim de diminuir este efeito mineralocorticoide, a hidrocortisona foi modificada na sua estrutura química e, desenvolveram-se vários outros AIEs, com preferência maior pela ativação dos receptores glicocorticoides, os quais produzem os efeitos anti-inflamatório e imunossupressor.
Neste sentido, foram desenvolvidos os fármacos: prednisona, prednisolona, metilprednisolona, triancinolona, betametasona e dexametasona.
Os fármacos foram colocados numa ordem crescente de seletividade para os receptores de glicocorticoides, ou seja, ativam mais os receptores glicocorticoides do que em relação aos receptores mineralocorticoides, portanto, causam menor edemaciamento no paciente.
Além disso, como os fármacos AIEs são administrados em quantidades maiores quando comparadas as quantidades produzidas fisiologicamente, estes fármacos inibem o hipotálamo impedindo, assim, a produção endógena destes hormônios.
Desta forma, durante a administração destes fármacos, a produção dos hormônios esteroides pode ser inibida totalmente, dependendo da dose e do tempo de administração.
Desta forma, como o organismo está deficiente da produção fisiológica destes hormônios, não se deve parar drasticamente a administração destes fármacos, pois esta parada repentina poderá deixar o organismo sem hormônios esteroides circulantes. Neste caso, deve-se fazer a retirada destes fármacos de uma forma gradual (desmame), a fim de dar o tempo do organismo voltar a produzir os hormônios fisiologicamente.
A retirada abrupta dos fármacos glicocorticoides poderá gerar sintomas da Síndrome de Addison (ver no final deste post).
Efeitos adversos dos AIEs
Os efeitos colaterais tendem a ser observados com o uso de grandes doses ou a administração prolongada destes fármacos.
– tendência a osteoporose: devido a sua ação aumentada no metabolismo do cálcio, consequentemente, o paciente apresentará um risco maior de fraturas.
– tendência a hiperglicemia: devido ao aumento da produção de glicose pela gliconeogênese e, que poderá desenvolver diabetes no paciente.
– diminuição da massa muscular e fraqueza: devido a ação dos glicocorticoides na diminuição da produção de proteínas musculares. Em crianças, se o tratamento for mantido por longos períodos, poderá ocasionar em inibição do crescimento.
– acumulo de gordura em algumas regiões do organismo: este efeito se dá pelo fato dos glicocorticoides redistribuírem a gordura corpórea para as regiões abdominal e nos ombros.
– edemaciamento: devido a ativação dos receptores mineralocorticoides, com consequente reabsorção de sódio e agua pelos rins.
– observa-se ocorrência de euforia, porem alguns pacientes podem ficar deprimidos e desenvolver sintomas psicóticos.
– tendência a hipertensão: devido a liberação de noradrenalina e ativação dos receptores alfa-1 nos vasos sanguineos, produzindo vasoconstrição.
– diminuição do suprimento sanguíneo do osso pode causar necrose avascular da cabeça do fêmur.
– incidência maior de cataratas em pacientes com artrite reumatoides após administrações prolongadas de glicocorticóides. Também foi observada a ocorrência de catarata em crianças.
– supressão da capacidade de produção de hormônios esteroides endógenos: devido a inibição do hipotálamo.
– deficiência de cicatrização de feridas.
– supressão da resposta a infecção ou lesão: devido ao efeito anti-inflamatório e imunossupressor. Neste sentido, uma infecção intercorrente pode ser potencialmente muito grave, a não ser que seja reconhecida e tratada com antibióticos.
– outros efeitos tóxicos relatados incluem glaucoma, elevação da pressão intracraniana, hiporcoagulabilidade do sangue, febre e distúrbios da menstruação.
Todos estes efeitos produzidos pela administração dos fármacos glicocorticoides produzem a chamada Sindrome de Cushing iatrogênica (iatrogenia = produzido por um fármaco).
A figura 2 ilustra os efeitos produzidos pela administração prolongada dos glicocorticoides, os quais são reunidos e denominados de Sindrome de Cushing iatrogênica.
Fig. 2: Efeitos dos glicocorticoides: Sindrome de Cushing iatrogênica.
Fonte da imagem: (http://fisiologiaufpi2015.blogspot.com.br/2015/04/sindrome-de-cushing-e-exercicio-fisico.html)
Síndrome de Addison
A síndrome de Addison, ou insuficiência adrenal primária, é caracterizada por uma baixa produção de hormônios do córtex das adrenais, sobretudo de glicocorticóides e de aldosterona.
Estima-se que cerca de 1 a 4 pessoas entre cada 100.000 indivíduos tenham essa doença, que foi originalmente descrida pelo médico Thomas Addison, em 1849.
Geralmente essa baixa atividade das adrenais é consequência de outras complicações, como doenças autoimunes, tuberculose, HIV, infecções fúngicas, hemorragias, tumores na adrenal, entre outras.
Além, disso, pode haver também uma produção reduzida de ACTH, o hormônio responsável por estimular as adrenais, havendo, portanto, uma atividade reduzida dessas glândulas (esse quadro é conhecido como insuficiência adrenal secundária).
É importante ressaltar também que pacientes que fazem uso medicamentoso de glicocorticóides por período prolongado podem apresentar sintomas semelhantes aos da doença de Addison caso os medicamentos sejam subitamente suspensos.
Isso ocorre porque o fornecimento de glicocorticóide exógeno gera um feedback negativo na síntese endógena desse hormônio, levando a uma baixa atividade da adrenal. Assim, recomenda-se que haja uma retirada gradual desses medicamentos, de forma a se evitar posteriores complicações.
Os sintomas mais frequentes são: redução da pressão sanguínea e do ritmo cardíaco, hiperpigmentação da pele, diarréia crônica, fraqueza muscular, fadiga, perda de apetite, perda de peso, letargia, náusea, vômitos e vontade exagerada de ingerir sal.
A redução da pressão sanguínea e do ritmo cardíaco estão relacionadas a função que os glicocorticóides exercem no metabolismo do stress e a uma deficiência, ainda que em menor grau, na produção de aldosterona.
Os glicocorticóides, ajudam a aumentar o ritmo cardíaco e a pressão sanguínea em resposta a situações de stress. Já a aldosterona é responsável pelo balanço de sódio e potássio no corpo, sendo que a sua carência leva a baixas concentrações de sódio e altas concentrações de potássio no sangue.
O sódio é o grande regulador da pressão sanguínea, estimulando a retenção de água e o aumento da pressão. Assim, baixas concentrações de sódio devido a uma carência em aldosterona levam a uma queda na pressão.
A queda nos níveis de sódio justifica também a vontade exagerada de ingerir sal.
Como o cortisol atua também no metabolismo de carboidratos, lipídeos e proteínas, estimulando a gliconeogênese e a formação de estoques de gordura a longo prazo, sua carência pode levar a uma perda de peso não intencional.
Geralmente, o tratamento da doença de Addison é feito por meio de reposição hormonal, de forma que o paciente recupere os efeitos desejáveis desses hormônios. No entanto, a longo prazo, o tratamento deve englobar também a doença causadora da insuficiência adrenal.
Crédito da Imagem:
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